O prof. Nussenzveig (16/01/1933-05/11/2022) atuou no Departamento de Física da PUC-Rio entre 1983 e 1994.
Graduou-se no IFUSP, Instituto de Física da Universidade de São Paulo. Na mesma instituição, doutorou-se, em 1957, sob a orientação do Prof. Guido Beck, e iniciou sua brilhante carreira de professor. Na primeira metade da década de 60 frequentou o Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas e fez diversos pós-doutorados em universidades europeias de prestígio. De 1965 a 1975, fixou-se na Universidade de Rochester, onde tornou-se Professor Titular; nessa época, acolheu alguns alunos da PUC-Rio que tiveram que deixar o país. De volta ao IFUSP, foi seu diretor, de 1978 a 1982. Em 1983, mudou-se para o Rio, onde foi contratado como Professor Titular pelo Departamento de Física da PUC-Rio. A partir de 1994, passou a integrar o Instituto de Física da UFRJ.
Além de ser um pesquisador excepcional, detentor de vários prêmios e títulos internacionais, o Prof. Moysés Nussenzveig contribuiu enormemente para a formalização de uma estrutura científica no Brasil. Nesse particular, participou de instituições como a Academia Brasileira de Ciências, CNPq, IMPA, PRONEX, entre outras, em cargos como coordenador de programas, membro de Conselhos Deliberativos, membro de Comissão de Avalição e Conselho de Fundação.
Como professor, ficou conhecido em todo o país por sua singular didática. Sua excepcional coletânea Curso de Física Básica, ainda hoje é utilizada na formação básica de Físicos e Engenheiros.
A trajetória de Nussenzveig refletiu as vicissitudes históricas que marcaram o desenvolvimento da Física Brasileira na segunda metade do século XX. Quando entrou para o curso, em 1951, a Física estava no auge de seu prestígio, dado seu papel crucial no desenvolvimento de armas e energia nuclear, e a jovem comunidade brasileira de físicos, que já havia alcançado prestígio internacional, soube utilizar esse prestígio para criar e ampliar instituições voltadas para o desenvolvimento de pesquisa em Física. O Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas foi talvez o resultado mais notável desse processo e foi lá que Nussenzveig iniciou sua carreira como professor e pesquisador, em 1956.
Quando Nussenzveig terminou sua graduação, em 1954, o Brasil ainda não tinha um sistema de pós-graduação institucionalizado, mas a USP contava em seu quadro de professores com a presença do físico alemão Guido Beck, que havia emigrado para a América Latina antes da segunda guerra mundial, escapando do nazismo. Beck foi um dos muitos estrangeiros que ajudou a formar as primeiras gerações de físicos brasileiros. Comprometido com a formação de novos pesquisadores, Beck reconheceu o talento de Nussenzveig e se prontificou a orientá-lo em uma tese sobre um problema de Ótica, campo no qual Nussenzveig ganharia reconhecimento internacional e ao qual dedicaria a maior parte de sua carreira. Além disso, Beck cuidou para que, após defender sua tese de doutorado, em 1957, Nussenzveig complementasse sua formação em estágios de pós-doutorado na Europa. Entre 1958 e 1960, ele passou pelas universidades de Eindhoven e Utrecht, na Holanda, pelo Instituto Nacional de Tecnologia de Zurique, na Suíça, e pela Universidade de Birmingham, na Inglaterra.
Nussenzveig retornou ao CBPF no começo da década de 1960 com a experiência acumulada na interação com alguns dos grandes físicos da época para dar início à sua própria linha de investigação. Entretanto, a crise econômica que assolou o Brasil no começo daquela década tornou demasiadamente árdua a tarefa de fazer pesquisa no país. Juntamente com sua esposa, Micheline, também professora do CBPF, decidiu emigrar para os EUA onde conseguiu o emprego de professor visitante da Universidade de Nova Iorque. O casal Nussenzveig juntou-se aos muitos cientistas brasileiros que, nos primeiros anos da década de 1960, por razões econômicas, se viram impelidos a deixar o país em busca de melhores condições para a pesquisa, o que gerou um fenômeno conhecido como ‘evasão de cérebro’. Mas o que para eles seria uma estadia curta, até que a situação econômica do Brasil melhorasse, com o golpe civil-militar de 1964, agora por motivações políticas, acabou se estendendo por mais de uma década.
Tornou-se professor visitante do Instituto de Estudos Avançados de Princeton e, em 1965, mudou-se para a Universidade de Rochester, sede de um dos mais famosos e mais importantes institutos de Ótica do mundo, onde tornou-se professor titular.
Em Rochester, Nussenzveig acompanhou de primeira mão a revolução na Física promovida pela invenção do laser, crucial para o surgimento de novos campos de pesquisa, como a Ótica Quântica e a Ótica Não Linear. Nussenzveig foi também ator importante na criação e consolidação desses campos. Primeiro, porque ministrou os primeiros cursos de Ótica Quântica na América do Sul; na PUC-Rio, em 1968, e na Escola Latino-Americana de Física, em La Plata, Argentina, em 1970. E depois, porque as notas de aulas daqueles cursos deram origem ao livro Introduction to Quantum Optics (1973), um dos primeiros livros didáticos que ajudaram na formação de pesquisadores nesses novos campos, como o foram Nicim Zagury e Sérgio Resende em suas pesquisas pioneiras em Ótica Quântica.
Em termos políticos, Nussenzveig foi parte de uma rede de solidariedade que se formou nos Estados Unidos em prol dos cientistas e estudantes perseguidos pelo regime militar brasileiro. Um de seus atos de grande impacto na história subsequente foi acolher na Universidade de Rochester um talentoso estudante que havia sido expulso da PUC por meio do Decreto 477 do governo de Arthur Costa e Silva, em 1969 -- que, entre outras coisas, resultou na expulsão de estudantes considerados subversivos das universidades brasileiras. O Agente 477, como o estudante ficou conhecido, era o físico Luiz Davidovich, que concluiu seu doutorado em 1975 sob a orientação de Nussenzveig e se tornaria uma liderança internacional em Ótica Quântica e uma grande liderança institucional da ciência brasileira, inclusive presidindo a Academia Brasileira de Ciências.
Nussenzveig retornou ao Brasil em 1975 e, desde então, foi professor pesquisador no Instituto de Física da USP (1975-1983), do departamento de Física da PUC-Rio (1983-1994) e da Universidade Federal do Rio de Janeiro (1994-2022). Nesse período, ele continuou sua pesquisa em Ótica e deu início a uma nova linha de pesquisa em Biofísica, publicando e formando pesquisadores em ambas as áreas. Retornando ao Brasil em um período de expansão do sistema universitário, Nussenzveig dedicou-se também à melhoria do ensino de Física para a graduação e escreveu a coleção Física Básica, vencedora do Prêmio Jabuti, em 1999, e uma das principais referências dos cursos de Física básica nas universidades brasileiras. Ele contribuiu ainda para a divulgação científica e ensino básico por meio de projetos como a criação de kits científicos para atrair jovens do ensino médio para carreiras em ciência.
Membro atuante de várias instituições científicas, Nussenzveig contribuiu para estabelecer diálogo e cooperação entre físicos da América Latina e teve papel importante no Acordo de Não Proliferação de Armas Nucleares entre Brasil e Argentina. Por sua atuação multifacetada como pesquisador, professor, gestor e divulgador da ciência, ao longo de sua carreira Nussenzveig acumulou uma grande lista de distinções como a eleição como fellow da American Physical Society, da Optical Society of America e da Academia Mundial de Ciências TWAS, e prêmios como o Max Born, da Optical Society of America e a Grã-Cruz da Ordem Nacional do Mérito Científico. Além de tudo, Nussenzveig foi um grande defensor da ciência e da democracia brasileira até seus últimos dias.