:: Engenheiro Georg Herz (25/01/1933 - 24/11/2009)
Sobre petecas e computadores
A vida da PUC-Rio é feita do encontro das vidas daqueles que fazem dela uma realidade tangível e cheia de matizes. São os que nela atuam como professores, pesquisadores, funcionários e estudantes e são também colaboradores; ex-alunos; famílias de alunos, professores e funcionários; crianças e idosos que brincam ou passeiam em seu jardim; fornecedores; moradores da Gávea que cruzam o campus; visitantes das exposições do Solar; usuários da biblioteca vindos dos quatro cantos da cidade; alunos das escolas próximas, uma multidão enfim que enche de vida e colorido o campus. Alguns deles deixam marcas indeléveis na história da PUC-Rio.
É o caso do engenheiro Dr. Georg Hertz, que nos deixou no dia 24 de novembro de 2009. Sem ele a PUC-Rio não teria sido a primeira universidade latinoamericana a contar com um computador de grande porte.
O acervo do Núcleo de Memória guarda uma série de fotografias [ver aqui] do início dos anos 1960 em que Georg Herz aparece, muito jovem, comandando as operações do Borroughs 205 e seus complexos componentes e guarda também a carta datada de 15 de outubro de 1958 que define a compra do equipamento. Guarda ainda uma linda fotografia recente em que um Georg Herz maduro e emocionado acompanha, ao lado da pesquisadora Silvia Ilg Byington, o lançamento do Núcleo de Memória da PUC-Rio.
E temos a sorte de conservar o áudio, já transcrito, da entrevista que deu no dia 25 de julho de 2007 aos pesquisadores do Núcleo e na qual conta as aventuras do transporte e da instalação do Burroughs 205 na PUC-Rio, uma verdadeira operação de guerra da qual participou ativamente, como ele próprio conta nesse pequeno trecho da entrevista:
|

|
|
“[...] E aí se iniciaram as negociações entre as partes envolvidas, principalmente a PUC e a Burroughs. Não é fácil a gente se deslocar para 1958 e 1959, ou seja, falar em computador naquela época era um completo absurdo. [...] todo mundo dizia que o Brasil certamente não estava pronto para entrar na era da computação eletrônica por várias razões: não havia experiência, não havia outros computadores, não havia analistas, não havia programadores e não havia técnicos de manutenção. [...] Então se teve a idéia de se formar um consórcio de várias entidades que pudessem utilizar esses computadores. Entrou nesse consórcio o Ministério do Exército, o Conselho Nacional de Pesquisa, a Comissão de Energia Nuclear, a Companhia Siderúrgica Nacional, a Burroughs e a PUC. A PUC não entrou com dinheiro, entrou com o local e a instalação.
[...] Depois de grandes batalhas, finalmente em 1959 se conseguiram todas as licenças necessárias, todo mundo pagou o que tinha que pagar, e foram tomadas medidas para importar esse computador da Califórnia – a fábrica da Burroughs era em Passadena. Aí veio o grande problema de como transportá-lo. Não havia aviões como hoje, o avião maior que existia naquela época era um DC7C especializado em carga. Então nós alugamos um DC6 da Panamerican, na época, para transportar da Califórnia para o Rio de Janeiro. Estava incluído nas despesas, isso foi conseguido e o computador foi transportado do Galeão até a PUC num caminhão aberto do Exército. Eu me lembro disso, eu fui o primeiro que vi isso.”
Georg Herz – entrevista ao Núcleo de Memória da PUC-Rio
27/10/2007 |
O famoso 205 foi instalado na PUC-Rio e Georg Herz, então um jovem engenheiro da Burroughs, foi o encarregado de operar a parafernália de válvulas, fios, painéis e misteriosa maquinaria que punha em marcha o que então se chamava de cérebro eletrônico diante dos olhos assombrados de professores, estudantes e autoridades. E se hoje computadores de todos os tipos e de alto desempenho são ferramentas absolutamente essenciais de nosso cotidiano universitário, acessamos a Internet de qualquer ponto do campus pela rede WIFI e nos acostumamos a levar para toda parte nossos dados em drives externos de muitos terabytes; se hoje a o Departamento de Informática da PUC-Rio é referência nacional e internacional, devemos muito aos que, como Georg Herz, nos idos dos anos 50 do século passado, acreditaram no sonho de trazer para o campus da PUC-Rio o 205 e fazer assim de nossa universidade um marco do pioneirismo no campo da informática no Brasil e na América Latina.
Na Cerimônia da Memória realizada na Sinagoga de Botafogo, seus filhos, Daniel e Monica, lembraram do pai como um homem bom, capaz de um imenso amor à vida e à família e com duas grandes paixões na vida, além da paixão maior por Sandra, sua mulher e companheira da vida inteira: a música, que o levou a criar e presidir a Associação dos Amigos da Sala Cecília Meireles para dividir com a cidade o prazer dos bons concertos, e o jogo de peteca nas areias de Ipanema, que ele praticou por décadas com grande seriedade e competência. Daniel levou para a cerimônia a peteca de penas brancas, já muito gasta, que pertenceu ao pai e contou como o jogo, sem oponentes ou disputas e cuja única regra é não deixar a peteca cair, entusiasmava Georg Herz e tornou-se um símbolo, cheio de significados, da vida de seu pai.
Georg Herz foi um engenheiro de projeção, um grande empresário, um pai de família amoroso, um cidadão do mundo que ajudou a fazer melhor a vida da cidade que escolheu para viver, um grande apreciador de música, e um homem que soube, como poucos, os segredos que permitem, em qualquer circunstância, não deixar a peteca – real ou metafórica – cair. Foi também um grande colaborador da PUC-Rio.
Na história da PUC-Rio, Georg Herz tem uma dupla presença: sua filha, Monica Herz, graduou-se em História pela PUC-Rio e hoje, já doutora, é professora e pesquisadora do Instituto de Relações Internacionais (IRI). E a participação de Georg Herz na vinda e na instalação do Burroughs 205 foi fundamental para que a PUC-Rio pudesse ostentar o título de ter sido a primeira Universidade da América Latina a instalar em seu campus um computador de grande porte e a operar com ele. Por isso a PUC-Rio se lembrará sempre dele com carinho e com gratidão.
Margarida de Souza Neves
Departamento de História
Dezembro de 2009
Você tem alguma sugestão de nomes para essa galeria das nossas saudades? Gostaria de escrever sobre esta pessoa ou sugere alguém para fazê-lo? Você tem outras histórias do Dr.Georg Herz para contar? Escreva para nós no seguinte endereço eletrônico: nucleodememoria@puc-rio.br
|