Publicações do Núcleo de Memória da PUC-Rio

:: Construção - série Crônicas de Memória - Fotografias: janelas do tempo; artigo publicado em 30/10/2013, Jornal da PUC, Edição 275


Missa por D. Oscar Romero, arcebispo de El Salvador, assassinado em 24/03/1980. Fotógrafo: Antonio Albuquerque. Acervo do Núcleo de Memória.

            Uma sala em construção. Um altar.  Velas acesas.  E um grande número de sacerdotes, entre os quais é possível reconhecer os padres Garcia Rubio, Álvaro Barreiro, Antonio Pereira e José Carlos de Lima Vaz.  Não fosse a inscrição na faixa presa à parede inacabada, pouco mais saberíamos sobre a janela que a fotografia aqui impressa abre no tempo.

            Nela, as palavras do arcebispo de El Salvador, Oscar Romero, ditas na véspera de ser assassinado a tiros quando celebrava missa no dia 24/03/1980.  A faixa indica que na sala ainda sem reboco celebrava-se uma missa em homenagem a esse salvadorenho, nascido de uma família de mineiros em 1917, ordenado em 1942, que o Concílio Vaticano II, as Conferências Episcopais de Medellín e de Puebla e o contato intenso com o povo pobre transformaram em um bispo comprometido com a causa da justiça e, por isso, incômodo para os donos do poder.

            No acervo do Núcleo de Memória outras 12 fotos permitem descobrir mais informações e novas perspectivas do mesmo evento.  A sala em construção é o antigo Salão de Vidro que ocupava parte dos pilotis do Leme.  Eram 17 os padres que concelebraram aquela missa, entre eles o Reitor, Pe. Mac Dowell, o Vice-Reitor Acadêmico, Pe. Agostinho Castejón e professores de vários Departamentos.  E a razão pela qual a celebração não foi na pequena capela bem ao lado fica clara nas fotos que mostram o grande salão inacabado repleto de estudantes, professores e funcionários.

            Nos anos 1980, as diretrizes da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), a reflexão da teologia da libertação, e a organização do povo nas Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) uniram forças com outras instituições, outras matrizes de pensamento e outros grupos sociais na mobilização que levou à lenta abertura política e à democratização.  Na PUC-Rio, como em toda a sociedade, os debates de idéias e os confrontos de posições políticas eram constantes.

            Naquela manhã de março de 1980 diferenças e divergências foram suspensas para celebrar a vida de Oscar Romero, um homem corajoso e simples, capaz de falar a língua do povo e de lutar as lutas dos pobres.  No salão inacabado era possível entrever uma utopia que “ergueu no patamar quatro paredes sólidas / tijolo com tijolo num desenho mágico”, como na poesia feita música por Chico Buarque.  Não será a magia desse desenho que o papa que escolheu chamar-se Francisco propõe para a construção a ser erguida por todos nós?

Margarida de Souza Neves
Coordenadora do Núcleo de Memória da PUC-Rio

Wendy Macintyre
Aluna de graduação do IRI e bolsista de IC do Núcleo de Memória da PUC-Rio

 

Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro
Núcleo de Memória da PUC-Rio