Falecimento do Professor Dionísio Dias Carneiro, do Departamento de Economia da PUC-Rio

Um economista que fará falta ao país

Qualquer pessoa bem informada é capaz de entender o papel fundamental que desempenhou o ITA - Instituto Tecnológico de Aeronáutica - no sucesso da Embraer.

Ou de perceber a importância que tiveram as pesquisas da Embrapa na espetacular revolução observada no setor agropecuário nas últimas décadas. O que muita gente não percebe com tanta clareza, no entanto, é que o impressionante salto de qualidade por que passou a condução da política econômica nos últimos 20 anos foi, em boa medida, fruto de longo esforço de aprimoramento do ensino e da pesquisa na área de economia no país. Um esforço do qual participaram várias instituições acadêmicas a partir dos anos 60 e 70.

Morreu dia 29 no Rio, pouco antes de completar 65 anos, Dionísio Dias Carneiro, um economista que desempenhou papel crucial nesse esforço.

Carioca, estudou no Colégio Militar e cursou a Faculdade de Economia e Administração da UFRJ. Em 1968, foi admitido no programa de mestrado da Escola de Pós-Graduação em Economia (EPGE) da Fundação Getúlio Vargas, onde se beneficiaria da presença marcante de Mário Henrique Simonsen, no auge de sua dedicação à vida acadêmica. Da EPGE, partiu para um programa de doutorado nos EUA, em Vanderbilt, onde a estrela era Nicholas Georgescu-Roegen.

Mais tarde diria que seus grandes mestres tinham sido Oscar Portocarrero, Mário Henrique Simonsen e Nicholas Georgescu-Roegen.

Retornou ao país como professor da Universidade de Brasília. No final de 1973 aceitou convite de Simonsen para voltar ao Rio, como professor da EPGE, para a montagem de um programa de doutorado. Poucos meses depois, contudo, Simonsen afastou-se da instituição para assumir o Ministério da Fazenda no governo Geisel. Dionísio Carneiro permaneceria por três anos e meio na EPGE. Mas, em meados de 1977, sua crescente insatisfação com o projeto acadêmico que havia prevalecido na instituição levou-o a se transferir para a PUC-Rio, com dois outros professores da EPGE, para ali criar um programa de pós-graduação em economia.

À PUC-Rio, Dionísio Carneiro ficaria vinculado por 30 anos. Durante a maior parte desse período, em regime de tempo integral. Foi uma das figuras centrais na construção institucional que, em poucos anos, transformou o Departamento de Economia da universidade num centro de excelência em ensino e pesquisa na área, com grande influência na concepção da política econômica no país. Nesse processo, destacou-se pela liderança intelectual, pela lucidez de suas análises, por sua incansável participação no debate econômico e por seus dotes como educador e formador de talentos. Tinha extraordinária capacidade de incutir ambição intelectual nos alunos e de induzi-los a desenvolver visão mais ampla dos problemas que lhes interessavam.

Basta uma lista curta de ex-alunos, de mais de uma geração, sobre cuja formação teve grande influência - como André Lara Resende, Armínio Fraga, Ilan Goldfajn e Eduardo Loyo - para se perceber a importância do papel que desempenhou no processo de modernização e racionalização da política econômica que teve lugar no país desde o início da década de 90.

Nos últimos anos dedicou-se ao Instituto de Estudos de Política Econômica da Casa das Garças que, graças a ele, se firmou, em pouco tempo, como um dos principais espaços de discussão de políticas públicas no país. Conciliava essa dedicação com atividades de consultoria, artigos quinzenais no "Estadão" e participação em conselhos de empresas. Sempre nos estritos limites de uma saúde muito precária.

O parágrafo final de um dos seus últimos artigos, no "Estadão" de 21 de maio, bem ilustra a admirável argúcia com que buscava resgatar o bom senso no debate econômico. "O candidato do PSDB declara-se contra a independência do Banco Central e a candidata do PT mostra que não sabe o que é restrição fiscal. Para ambos, algo a pensar. Quem leva a sério a responsabilidade fiscal não precisa tirar a independência do Banco Central. Quem não leva não merece mandar no Banco Central."

Vai fazer muita falta. Ao país e aos amigos.

Rogério Furquim Werneck
Professor do Departamento de Economia da PUC-Rio

* Rogério Furquim Werneck autorizou a transcrição deste texto.

Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro
Núcleo de Memória da PUC-Rio